O grande astro dos filmes de velho oeste prova que aos 91 anos de idade consegue dirigir, produzir e estrelar um filme digno a sua era de ouro. O novo filme de Clint Eastwood traz uma jornada desafiadora em todos os sentidos, unindo uma dupla bastante improvável que anseia por um novo começo, uma redenção e colocam em prática o real significado de ser um bom homem.
Acompanhado de uma trilha sonora fantástica e uma fotografia igualmente impactante, “Cry Macho” se apega a algumas ferramentas já conhecidas no cinema, como por exemplo: a dupla que deve se unir para chegar a um determinado ponto e acabam se apegando ao longo do caminho. Há uma grande semelhança com Relatos do mundo, de Tom Hanks, e até mesmo Logan, de Hugh Jackman, porém com menos profundidade e drama que esses filmes carregam. Ainda assim, isso não diminui a qualidade do filme, só o coloca num nicho já conhecido pelos espectadores, e, consequentemente, já sabemos o que esperar.
Há de salientar que, por mais que o filme coloque inúmeros empecilhos e dificuldades para que o protagonista não consiga atingir seu objetivo inicial (encontrar o garoto e convencê-lo de ir para os Estados Unidos), tudo acontece MUITO rápido. Como se “Cry Macho” deixasse claro que todo esse plot que envolve a “captura” do garoto fosse o segundo plano, enquanto o foco do filme ficaria para o desenvolvimento da relação pessoal entre os dois.
Clint faz um personagem amargurado e cheio de remorsos, que tem que lidar com a perda de um sonho após fraturar a coluna, além de conviver diariamente com a perda de sua família em um trágico acidente. Infelizmente isso é pincelado no filme, contado de forma superficial. Acredito que se o roteiro elaborasse mais esse viés da personalidade do protagonista o filme criaria uma história mais marcante. Em vez disso, a narrativa acaba criando um personagem um tanto quanto debochado e irônico, cheio de frases soltas que acabam garantindo algumas risadas.
Ainda assim, vale mencionar que o filme usa como uma metáfora bastante interessante a própria profissão do protagonista do filme — uma ex-estrela do rodeio e criador de cavalos — para desenvolver a relação com o Rafa (Eduardo Minett), um menino cheio de mágoa, desconfiança, cicatrizes e temor, igual a um cavalo selvagem. A trama consegue trazer de forma explícita nas cenas em que Mike (Eastwood) ensina ao menino andar a cavalo, ao mesmo tempo que doma os animais. Ambos personagens se encontram no meio de uma vida amargurada e encontram um novo caminho para uma vida que já haviam desistido de procurar ter.
Vale destacar que a todo momento o filme acaba se fundindo com uma possível mensagem pessoal de Clint, em diálogos dramáticos e bastante intensos, a narrativa cria algo mais intimista e nos prepara para uma possível despedida do ator as telonas, ou simplesmente o marco de uma nova era para a vida do cineasta.
Durante todas as 2 horas de filme, Mike (Eastwood) mostra na prática ser o melhor exemplo de pai e homem que Rafa (Minett) já teve em sua vida. O real significado do nome do filme não vem da galinha, que compartilha do nome Macho, mas da desmistificação do estigma do cowboy brutamontes. Clint traz um lado mais sentimental e dramático, as vezes até amoroso, coberto por camadas de piadas irônicas, ao lado de Minett que desempenha um papel belíssimo, cheio de carisma, o ator consegue encantar, divertir e emocionar diversos momentos da trama.
A direção de Eastwood não ousa em enganar o espectador e esconder o fato de que ele já tem mais de 90 anos, então tudo acontece em seu tempo. Apesar da câmera escolher ficar mais próxima do ator, dando preferências a cenas em primeiro plano, ele não se omite em trazer sequências mais abertas e dando destaque a sua locomoção e algumas limitações que sua idade traz. Eastwood traz a nostalgia dos campos abertos e paisagens de tirar o fôlego, e é uma pena que não tenha explorado igualmente as paisagens do México como explorou as do Texas.
Apesar do filme trazer uma certa nostalgia com filmes do velho oeste, Clint cria um personagem que se distancia um pouco dos seus antecessores. No entanto, traz a essência galã que construiu em sua carreira. No começo pode causar certa estranheza a proposta, todavia a narrativa conduz de maneira crível e madura o relacionamento amoroso do protagonista que chega ser impossível ao fim não torcer por um final feliz digno da novela das 8.
O filme peca apenas em se manter superficial na trama geral, enquanto foca em diálogos muito bem escritos, o roteiro acaba ficando preguiçoso com os obstáculos que os personagens devem enfrentar ao longo de sua caminhada, se tornando tudo muito fácil e sem sal, causando a previsibilidade e tirando à força da audiência o elemento surpresa do longa. Inclusive o momento que deveria ser de tensão e emoção, ao descobrir um segredo que poderia interferir na relação da dupla, é total anticlimático.
“Cry Macho” é um filme que marca um novo capítulo, talvez a despedida ou uma nova etapa na vida de Clint Eastwood. Cria personagens fáceis de se amar e evidencia que o significado de “macho” vai muito além do paradigma machista, mas peca em não ser ousado quando se abstém de criar uma trama geral mais ambiciosa.
O filme estreia nos cinemas de todo o Brasil amanhã, 16 de setembro.
Nota: 3,8/5
Autor do Post:
Ludmilla Maia
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25 anos. Criadora e uma das fundadoras da Tribernna, escrevo pra internet desde 2016. Amo podcast como amo cultura asiática e heróis. Nas horas vagas, concurseira e bacharel em direito.
Um dia eu te conto o que significa o nome “Tribernna”.