3T INDICA | Trem Infinito é uma aventura oitentista para ser maratonada de uma só vez

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Não mais tão recém-chegado ao Brasil, o streaming da HBO ainda possui um acervo inexplorado e bastante interessante. Numa das minhas explorações, encontrei um verdadeiro tesouro escondido com autoria da Cartoon Network: Trem Infinito é uma aventura mágica, tecnológica e mestra de uma atmosfera nostálgica voltada oficialmente para crianças, mas poderia facilmente ser classificada como adulta pela maturidade de suas abordagens. Ficou intrigado? Vem saber mais sobre essa obra psicológica que é quase uma sessão de terapia.

Trem Infinito é uma série antológica que acompanha a história de Tulip (Ashley Johnson): uma garotinha que se vê presa em um trem com um número infinito de vagões e que em cada vagão possui um universo inteiro e único. Descer do trem não é uma opção segura, então Tulip procura respostas sobre o misterioso número em sua mão e um caminho que a leve de volta para casa.

Embora a trama seja simples, o conteúdo conciso dessa narrativa é gigante e bastante filosófico. Composta por 4 temporadas (ou “livros”) e 40 episódios de 10 minutos, a série é repleta de questões sobre crescimento pessoal e amadurecimento. Sob a direção do novato Owen Dennis, sua criação e raconto são carismáticos o suficiente por si só; mas a história ainda é ambientada numa atmosfera futurista retrô, com muitos sintetizadores na sonoplastia e cenas de ação oitentistas familiares.

Isso fica bem nítido na segunda temporada, com a inclusão de visuais e personagens punks, fotografia neon e tramas aventureiras dos anos 80. E não, isso não deixa a obra datada ou desesperada para arrecadar carisma utilizando um recurso fácil. E sim, os anos 80 jamais morrerão na cultura pop. Dennis consegue com destreza utilizar boas referências para sintetizar as histórias micro (os episódios) e macroscópicas (as temporadas), criando um vínculo entre nós, os espectadores, e sua história. Além disso, há uma nostalgia quase secreta no ar, que talvez não consigamos identificar de primeira, mas que é resultado da combinação entre personagens carismáticos, roteiros inteligentes e temas abordados.

Como já falado, trata-se de uma história antológica: cada “livro” acompanha uma narrativa diferente, a qual se entrelaça com as outras nos fornecendo a sensação de continuidade ao resgatar alguns personagens do passado. Bem parecido com As Crônicas de Nárnia. O problema é chegar ao fim da temporada e dar adeus aos indivíduos que vimos evoluir tão organicamente. Afinal, os passageiros lá estão para amadurecer e aprender. Logo, os personagens crescem e aprendem, e nós aprendemos com eles. Formar um vínculo narrativo envolvente desse jeito é tão difícil… tipo, nível This Is Us de aprendizado.

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E não pense que é um crescimento infantil, restrito ao público pueril. Embora todos ali sejam deveras crianças, seus problemas, diálogos e situações são adultos. Há aspectos psicológicos bem desenvolvidos ali dentro, que carregam lições poderosas e reflexivas dignas de BoJack Horseman, mas beeeeem menos violentas. As personagens de cada história crescem a partir de problemas identificáveis e/ou simplesmente comuns. Logo, é fácil de se relacionar com eles e torcer por eles. Quando a Tulip, por exemplo, entende o sentido de seus próprios sentimentos, nós conseguimos olhar para dentro de nós mesmos e compreender questões fundamentais do comportamento humano. Há tanta similaridade com a realidade… Pixar, corre aqui!

Mas a criatividade não acaba nas personas. A concepção de cada vagão é de encher os olhos com tanto repertório psíquico. Os obstáculos criados para que cada personagem compreenda, desenvolva-se e cresça é de espantar pela natureza de sua simplicidade ao esconder objetivos que parecem óbvios, mas que não são. Um roteiro de qualidade é aquele que consegue discutir com simplicidade temas não tão simples assim. E com reviravoltas bem construídas: nenhum plot twist foi corrido ou inserido às pressas. Todos conseguem nos pegar de surpresa e fazer qualquer fã veterano de Steven Universo deixar cair o queixo.

Por fim, se tem uma palavra que define bem essa série curta e já finalizada é amadurecimento. Não somente dos personagens, mas também de suas tramas bem construídas e fundamentadas. Cada temporada evolui progressivamente com um ritmo timidamente calculado, começando sua primeira história com crianças e finalizando seu último livro com adultos. Assim como seu parente não tão distante BoJack Horseman, Trem Infinito é uma aventura introspectiva carismática, adulta e tristemente negligenciada pela Cartoon devido à sua natureza tão “não-tão-infantil” assim.

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Nota: 4.3/5.0

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Autor do Post:

Matã Marcílio

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Um pré-fisioterapeuta nordestino que, perdido no mar das incertezas, fez das palavras seu refúgio. Um pouquinho mais de duas décadas de leitura e sedentarismo causado pelo prazer de deitar em frente a um espelho negro e observar toda a glória do homo sapiens ao escapar da realidade terrivelmente entediante. “Jojo Betzler. Hoje, só faça o que puder.”

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